Com os olhos nas nuvens.
As mãos vagueiam na atmosfera úmida.
Sinto
E vejo as estrelas mortas na praia.
Tudo é amplidão
E espuma
Que o vento desintegra.
por Sérgio Araújo
Com os olhos nas nuvens.
As mãos vagueiam na atmosfera úmida.
Sinto
E vejo as estrelas mortas na praia.
Tudo é amplidão
E espuma
Que o vento desintegra.
por Sérgio Araújo
Há menos mistérios nas cores do dia.
Vejo agora o que antes perdia-se no afã dos sorrisos fartos,
Os detalhes se insinuam
Como estrelas no amanhecer
E eu os apanho com destreza.
Não vejo nisso uma façanha,
O que me importa
São as histórias inacabadas que completarei
Os assuntos sem memória que se pronunciam ao léu,
Os retratos sem faces no mosaico das ruas…
por Sérgio Araújo
Como crateras escavadas na noite densa para abrigar os restos de sua alma vazia; assim eram os olhos de Zulmira. Não via nos becos sórdidos a decadência das gentes, mas uma potencialidade para o inesperado e o fatídico.
Ela zombava do tempo e do ser. Nas tempestades da carne e no redemoinho da embriaguez delirante encapsulava antídotos e panaceias para os breves dias de amarga lucidez.
Em outros palcos, novos atores, velhos canastrões, máscaras partidas no relance dos braços e abraços enclausurados na inconsistência da troca. Nada de afetos afoitos ou sinceras desculpas.
Gente se parte ao meio – dizia - como quem rasga uma antiga fotografia para segregar memórias. Zulmira, a dama da noite, rompia a escuridão tateando na atmosfera onírica do seu próprio destino encrostado nas pedras das ruas.
Zulmira, por trás da fumaça, imprimia no ar um sorriso ácido como o blues que brilhava na superfície negra do vinil.
por Sérgio Araújo
O vagão arrasta seus aros de aço
Os olhos esbugalhados simultaneamente fragmentados
no vapor fugaz
Um traço
Rangem esferas de rostos
Não há palavras
Apenas espelhos em cacos
Cada uma ponta
Afia uma outra imagem
E aponta
Em diferentes pontos
Os fragmentos do todo
E o desdobro
Do olho panorâmico de Bentham
Estacionário e sinérgico
Como num quadro futurista
Ou num filme de Eisenstein.
por Sérgio Araújo
O mar avança sobre os pés de Hermes, enquanto uns peixinhos nadam apressados nas poças rasas e transparentes junto às pedras da praia.
O silêncio proporcionava uma sensação de comunhão com o universo. Só, Hermes sonhava olhando o horizonte alaranjado como numa ilustração de livro infantil
Nada mais poderia ser tão importante a ponto de quebrar a sintonia daquele instante quase mágico, tão simples e tão complexo como o sentido de tudo.
Estava tudo ali e, ao mesmo tempo, nada parecia explicar-se por si só. O caso é que Hermes sabia não ser. Talvez nem soubesse. Na dúvida, ele varou o espaço com lascas de vidro do seu olhar turvo e inquiridor.
Adiante, o sussurro do vento o nada.
por Sérgio Araújo