Em minhas velhas tralhas esquecidas.
Me surpreende, me encanta, me choca.
É um reencontro com o meu próprio lixo,
Sedimentado numa área alagada qualquer
Da minha existência desvelada.
Me encanto no desencanto.
Não posso criar sem desencantar-me
E, desencantando-me, me encontro
Num encanto imaginativo.
Quando desconstruo o dia e a cidade,
Ergo minha imaginação,
As minhas imagens em movimento
Num palco sem platéia.
E eu queria poder olhar-me
Com olhos de outros,
Como um crítico escondido atrás das luzes.
Não é de mim que falo apenas.
Eu também sou esse crítico que te ofusca
E te vejo só e desnuda.
Você pessoa
Que por trás de toda a tinta
É tão crua...
Tão só.
Não nos vemos, não nos tocamos,
Mas criamos.
E cá estamos a nos encontrar.
Você me lê e isso é mais seu do que meu.
Você me recria embaralhando nossas tralhas.
Eu te imagino, imaginando o que sei e o que não sei de nós.
Portanto, te digo: eu não sei!
Só queria saber o que pode um poema
Nesse encontro.
Você e eu.
Pessoas do mesmo verbo.
por Sérgio Araújo.
Chove!
Aqui ninguém me alcança.
Rabiscando no topo da página em branco, sutilmente, foi transportado para além das pautas; essas bitolas horizontais que suportam e aprisionam o sentido das coisas. Como representar, já que nada havia para suportar seus rabiscos, a profusão de sons, cores e formas que experimentava naquele instante único e estranhamente desafiador, de modo a fazê-los contidos em seus próprios universos atomizados e espalhados na geléia disforme e ilimitada? 
Quando as folhas dançam no ar
Sendo ainda criança, não sabia das regras do mundo. Nada sabia daquilo que obrigava os homens a trabalhar por dinheiro, as mulheres a servir e as crianças a desobedecer os ditames; fardos, que os adultos carregavam com grande sacrifício e compartilhavam entre si, arrastando suas hipocrisias sutis.
Um som passou por aqui. Deixou suas marcas no silêncio entre o sol e o lá. Silêncio cheio de falas na sala imensa em cujo eco abundam coisas de sentir.
Sobreface.