quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Lapso



Não conhecia nenhuma daquelas pessoas que transitavam freneticamente pela ladeira íngreme e estreita. O fluxo constante deixava-o atordoado e aumentava a sensação de abandono que havia surgido desde que se dera conta da situação em que se encontrava.
Foi como se tivesse surgido do nada. Encostado no velho poste de ferro reparou na marca de fabricação gravada no metal:Düsseldorf -Deutschland.
Aquelas palavras não saiam da sua cabeça e ficou repetindo: Düsseldorf, Deutschland, Düsseldorf...,enquanto caminhava em meio àquela gente calada e, aparentemente, insensível.
Subiu alguns metros, desceu outros tantos... Na verdade, não sabia para onde estava indo nem tampouco aonde se dirigir naquele lugar estranho.
Não estava em outro país! Embora estivesse com medo de falar com as pessoas, de perguntar-lhes onde estava,sentia familiaridade nos cheiros, sons e texturas que impregnavam os sentidos.
Não era medo, de repente soube, o que lhe impedia de comunicar-se. Era antes, uma certeza absoluta sobre a impossibilidade de comunicação com aquela gente fria e distante. Por um momento, orgulhou-se disso. Sorriu com o canto da boca para não deixar que percebessem o prazer que sentia.
Düsseldorf - Deutschland! Voltou  ao velho poste que suportava uma pequena lâmpada suspensa na extremidade oscilante de cano escuro que surgia do corpo negro do poste fabricado em Düsseldorf,Deutschland.
Parado ali, não se importava mais com aquela gente. O sistema voltou a funcionar normalmente. Digitou as coordenadas e desapareceu.

por Sérgio Araújo

Um comentário:

  1. Sérgio, é incrível como você consegue mesclar ficção científica com o existencialismo humano. Continuo me fascinando.

    Um objeto pode ser mais humano do que humanos objetos, eu sei. Já aconteceu comigo. Grandes textos são como o seu, que sempre faz o leitor abrir uns botões da camisa e reconhecer uma cicatriz no peito.

    Abração
    E ah, sobre o marcador "falta de criatividade" nos meus textos...
    acho que é a (sempre excessiva)auto-crítica. :)

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